Mosquitos transmissores vivem em florestas e podem alcançar imóveis perto da mata

Fonte por Guilherme Ramalho e Ludmilla De Lima para Jornal O Globo

Verde, ar puro e tranquilidade. Áreas como o Corcovado, o Jardim Botânico, o Alto Gávea e o Cosme Velho sempre foram vistas como refúgios em meio à cidade grande. Mas a paz no entorno da Floresta da Tijuca não é a mesma desde que a febre amarela silvestre se tornou uma ameaça. A doença é transmitida por mosquitos das espécies dos gêneros Haemagogus e Sabethes, que vivem em florestas como a da Tijuca e podem alcançar imóveis perto da mata. O medo tem feito muita gente na região repensar hábitos, ampliar o estoque de repelentes e correr para os postos de vacinação.

Na semana passada, preocupada com uma possível proliferação da doença, a direção da escola de educação infantil Jardim Botânico — que costuma promover passeios em trilhas, parques e jardins — cancelou uma ida das crianças ao Parque Lage. Os pequenos foram, então, fazer atividades ao ar livre na Praça Pio XI, no Jardim Botânico. Mas devidamente protegidos com repelente.

— Toda semana fazemos passeios com as crianças no Jardim Botânico, no Parque Lage ou aqui na pracinha. Com essa notícia dos macacos mortos por febre amarela, os pais começaram a ligar pedindo “por favor, coloquem repelente no meu filho” — afirmou a diretora, Karen Sampaio.

Karen, que tentou, sem sucesso, tomar a vacina no posto da Gávea na quinta-feira, agora aguarda mais informações das autoridades para saber se precisará mudar a rotina da escola. Ela também pretende levantar quantas crianças ainda não foram imunizadas.

Moradora da Gávea, a designer gráfica Rita Ariane brincava na quinta-feira com a filha Elis, de 1 ano, na Pio XI, onde, no passado, dois macacos foram encontrados mortos. O problema, no entanto, está no mosquito, já que os animais não são transmissores da doença.

— Vou agora passar repelente na Elis de novo — avisou a designer, assustada, enquanto segurava a criança no escorrega. — Ela vai fazer um ano na segunda-feira (hoje), e vou aproveitar para vaciná-la, inclusive contra a febre amarela. Eu gosto de estar com ela em jardins e parques, faz parte do meu estilo de vida, mas estou realmente preocupada. Se eu incluir no meu roteiro lugares com esse problema (com risco de transmissão da febre amarela), vou ter que repensá-lo.

Dentro do Parque Nacional da Tijuca, a preocupação é grande entre os funcionários, que reclamam da falta de vacinação das equipes. Um operador de trânsito da CET-Rio que trabalha no Corcovado disse que pretende se vacinar por conta própria. E um vigilante do parque, que pediu para não ser identificado, admitiu que teme pela própria saúde por estar desprotegido:

— Trabalhamos direto no meio ambiente. Nos dão todo o respaldo, só que agora estão demorando com a vacina. Estou doido para ser vacinado.

A presença de macacos nos bairros no entorno do parque também tem provocado apreensão entre os moradores, mas a primatóloga Cristiane Rangel tranquiliza a população:

— Os macacos não são transmissores da doença. Eles mostram que há uma doença viral naquele local. Eles são, na verdade, sentinelas — ressalta Cristiane, que ainda aguarda a contraprova dos testes que deram positivo para febre amarela em cinco de dez macacos mortos recolhidos em outubro de 2016. — Não há uma epidemia entre os macacos neste momento. Houve em outubro, mas com número baixo de mortes, que ainda podem ter sido provocadas por herpes.

A especialista pede às pessoas que, se encontrarem macacos doentes, não os levem a veterinários, uma prática comum, e contatem imediatamente o 1746 da prefeitura.

O escultor Edgar Duvivier mora numa casa no meio do verde no Alto Gávea, onde é com frequência visitado por macacos-prego. Mesmo vacinado contra a febre amarela, ele reforça os cuidados para afastar o verdadeiro vilão: os mosquitos, incluindo o Aedes aegypti.

— Temos que tomar cuidado é com o mosquito. Não podemos deixar lixo nem água acumulada, não só por causa da febre amarela, mas pela dengue, zika e chicungunha também. Não pode haver um ataque aos macacos. Meu conselho é se vacinar e não se apavorar com os bichos.

A antropóloga Ana Lucia Cahu vive no Cosme Velho e é fã da região, que, para ela, não tem as características de localidades onde a febre amarela vem infectando pessoas, como na área rural de Casimiro de Abreu. Ana Lucia disse não ter mudado sua rotina por causa da doença.

— Eu fico preocupada com a febre amarela, mas aqui no Rio, apesar da floresta, não temos características de zona rural — disse ela, que na quinta brincava com o neto Rafael, de 3 anos, na Praça São Judas Tadeu, ao lado do Trenzinho do Corcovado, com uma preocupação na cabeça: a de proteger a criança de picadas de mosquitos. — Tenho cinco netos e passo repelente neles também por causa de dengue, zika e chicungunha.

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